Foram dez anos de trabalho, mais de 60 mil quilômetros percorridos durante 891 dias e mais de 100 horas de imagens, mais de 400 rolos de filme, que registraram uma volta ao mundo que alcançou, a bordo do veleiro Aysso, mais de 30 países, quatro continentes e três oceanos. Muito mais que um diário de bordo da expedição O Mundo
O filme traz cenas inéditas que mostram o cotidiano da Família Schürmann, suas aventuras em alto-mar, icebergs, o mundo submarino, ilhas paradisíacas do Oceano Pacífico, tormentas no Cabo da Boa Esperança. Estas belas imagens, captadas em película Super 16mm, revelam como vivem as pessoas que os Schürmann encontraram ao longo da rota de Magalhães: Nita, a polinésia que mostra a beleza de sua terra, Gorronho que conheceram há nove anos no mar que os levou a conhecer o Chile, os piratas do Mar da China, tatuadores de Samoa, dançarinos de Bali entre outros tantos povos e paisagens fascinantes.
Para realizar esta tarefa, David contou com a ajuda preciosa de Vilfredo e Heloisa Schürmann, seus pais e idealizadores da viagem, que o apoiaram desde a pré-produção do longa-metragem até a finalização. Além de pais de David, eles foram parceiros, incentivadores, companheiros, personagens e narradores de O Mundo
Ao mesmo tempo em que acompanha a aventura da Família Schürmann, O Mundo
Navegar, a paixão da Família Schürmann
Assim como os grandes navegadores, a Família Schürmann é apaixonada pelo mar e pelas grandes rotas marítimas. A bordo do veleiro Aysso, a Família já circunavegou duas vezes o mundo. A primeira viagem, fruto de um sonho que nasceu anos antes, fez com que a Família mudasse sua vida e deixasse sua cidade, Florianópolis, para trás. Eles partiram quando David completou dez anos, em
Na segunda expedição, de
David Schürmann conta como foi filmar “O mundo em duas voltas”
Produtor e diretor formado em cinema e televisão na Nova Zelândia, David Schürmann viveu no mar dos 10 aos 15 anos, quando decidiu desembarcar e estudar cinema e televisão na Nova Zelândia. Não por acaso, seu décimo aniversário também marcou a partida da família para a viagem de volta ao mundo. Apaixonado por imagens, David ganhou sua primeira câmera aos 13 anos, quando registrou a passagem da Família pelo Canal do Panamá. Na Nova Zelândia, ainda recém-formado, foi convidado para trabalhar na televisão, onde dirigiu um programa para o público jovem que ganhou prêmios e fama por todo o país. A partir daí, foram diversos trabalhos, documentários e projetos. Até que um dia uma ligação durante a madrugada o chamou de volta a bordo do Aysso. E a história de O Mundo
Como nasceu a idéia de filmar a Magalhães Global Adventure?
Começou quando meus pais me ligaram para contar que iriam fazer a viagem e me convidaram para ir junto. Eu morava na Nova Zelândia e lá já era de madrugada. Quando recebi a ligação deles, estava dormindo e achei que algo ruim tinha ocorrido para me ligarem àquela hora. Mas eles estavam tão empolgados que nem se deram conta do fuso horário. Eu aceitei na hora, mas com uma condição: que aquela viagem virasse um filme.
E eles aceitaram imediatamente?
Aceitaram. Na verdade, não entenderam de imediato que seria um filme mesmo. E não um registro caseiro da viagem. Mas tudo acabou dando muito certo. O planejamento foi muito bem pensado. E eu tive total apoio deles. E acompanhei toda a viagem. Não só eu como toda a equipe do filme.
Em quantos vocês eram. A equipe era reduzida, não? Foi difícil realizar um filme em condições tão adversas?
Foi e não foi. Não se tratava de um filme normal. As condições eram totalmente inusitadas. Éramos eu, minha mãe, meu pai, a Kat, o assistente de câmera, o assistente de produção geral e um fotógrafo de still, que depois acabou virando o meu assistente também. Éramos sete em apenas
A convivência não era complicada?
Com certeza tinha seus desafios. Imagine que passávamos até 14 dias sem aportar. Não havia esta de ‘vou dar uma volta esfriar a cabeça e voltar’. Mas tive muita sorte. A equipe era muito boa, pois todos eram tripulantes e profissionais. Não havia a mordomia de se cumprir com a função e ir dormir. Todos tinham deveres a fazer no barco. Houve casos de, na Patagônia, o meu assistente de câmera ter passado horas de madrugada no leme, no seu turno. Em uma sensação térmica de dois graus negativos. E, exatamente quando amanhecia, em que ele me passava o leme e ia dormir, eu vi um nascer do sol maravilhoso e quis filmar aquela cena de qualquer jeito. Eu fui acordá-lo. Imagine que ele tinha passado à noite acordado, morrendo de frio do lado de fora, estava preparado para dormir. E ele, em vez de contestar comigo, o que devia fazer mesmo, levantou-se com boa vontade e fomos filmar. Isso é raro. Mas são casos como este que fazem diferença. Se eu pudesse, teria mais duas pessoas comigo na equipe, mas o barco não suportava.
Vocês estiveram presentes em todos os momentos da viagem ou fizeram um recorte dela?
Recorte nenhum. Estivemos presentes o percurso todo, de
Houve alguma cena muito tensa, que envolveu perigo real? As cenas da tormenta parecem ter sido extremamente difíceis de realizar.
Aquela tomada foi realmente uma das mais difíceis de fazer. Além do perigo, havia o lado do mal-estar. O mar jogava muito e eu comecei a marear. Havia o perigo de eu literalmente perder os sentidos. Foram quatro dias de tempestade, mas isso concentrado chega a parecer quatro meses. Lembro-me que, naquele dia, eu estava no cockpit assistindo a tormenta. E as ondas eram imensas, mas lá de dentro não se via exatamente o que de fato era a fúria de uma tempestade como aquela. Resolvi que iria para fora, para filmar o real. Pedi que me amarrassem. Usei uma caixa estanque para abrigar a câmera, que era usada para as tomadas submarinas. A força da onda era tamanha que havia momentos em que parecia que eu iria ser arrancado do barco. É como uma montanha russa. Foi apenas uma vez, mas foi suficiente.
Valeu a pena porque conseguimos transmitir exatamente para quem está assistindo ao filme a sensação de estar ali.
Além de parceiros, personagens e tripulantes, Vilfredo e Heloisa não deixam de ser seus pais. Como foi dirigir os próprios pais?
Era complicado no começo. Afinal, é preciso acertar o passo entre ser o filho que filma uma viagem dos pais e o diretor que registra uma viagem de navegadores pelo mundo. Claro que há o respeito que eu tenho como filho, a relação afetiva, mas conseguimos, tanto eu quanto eles, sermos profissionais e separar os papéis quando era necessário.
Houve alguma providência especial para conseguir esta separação?
Sim. Houve muita conversa sobre isso. E, em algumas situações, quando eu precisava entrevistá-los, eu pedia para uma terceira pessoa fazê-lo. Eu dirigia a cena, filmava, mas não era o interlocutor direto deles. Isso facilitou, pois eles não estavam contando uma história para o David. E sim para o espectador. No começo, eles olhavam para mim no fim dos depoimentos, para checar se estava tudo certo. Mas, com o tempo, eles se acostumaram e já não faziam mais isso. Encontramos um meio-termo.
E a narração? Apesar de Heloisa e Vilfredo não serem atores, você manteve a voz deles nos depoimentos em off.
Esta foi uma decisão difícil também. No início do processo da gravação destas narrações, foi complicado. Isso tudo já na pós-produção. Minha mãe é professora. É natural que tenha o tom de voz de quem ensina, explica. Meu pai também não é narrador. Tentamos até mesmo usar a voz de atores profissionais, mas senti que iria soar artificial. Depois de várias tentativas, chegamos finalmente ao tom que era necessário para o filme. Este era um tom de quem conta uma história para um amigo e não de quem dá uma palestra. Era muito importante isso.
Como nasceu sua paixão pelo cinema? Como alguém que cresce em um barco, consegue ter uma formação cinematográfica?
Isto é realmente algo especial em minha infância e adolescência. Eu passei dos 10 aos 15 anos no barco. Foi um período crucial para minha formação, para a formação do meu caráter. Eu sempre gostei de cinema. Aproveitava para assistir a filmes em cartaz nas ilhas em que aportávamos. Eu também sou apaixonado por fotos e imagens. E adoro contar histórias. Meu pai era quem sempre fazia os registros das viagens, era quem tinha a câmera fotográfica. E eu adorava acompanhá-lo. Minha mãe escrevia tudo que ocorria. Ela chegou a escrever para várias revistas pelo mundo e ganhava uma quantia considerável com este trabalho. E meu pai fazia as fotos destas matérias. Um dia, eu cismei que queria uma câmera para poder filmar a nossa passagem pelo Canal do Panamá. Isso foi em 1988, durante a nossa primeira volta ao mundo. Eu tanto fiz que meu pai comprou a tal máquina. E eu fui filmando o episódio, entrevistando as pessoas. Era tudo coisa de amador. Mas, quando concluímos a passagem, eu editei o material e exibi para as pessoas que, para minha surpresa, gostaram muito da história.
Foi a partir dai que você se decidiu pelo cinema?
Sim. Foi então que comecei a ver que podia fazer mais aquilo. E partir daí, estudei, fiz cursos e não parei mais. Lembro que meu primeiro “emprego” foi em uma iha do Pacífico. O dono de uma pousada local precisava fazer um vídeo promocional para atrair turistas. E meu pai sugeriu que eu o fizesse. O dono topou e lá fui eu realizar meu primeiro vídeo profissional. Com o dinheiro do pagamento, eu ‘paguei’ a comissão de agenciador do meu pai e ainda sobrou. E, depois disso, fiz vários outros vídeos. Olhando hoje, eram todos muito amadores, mas aprendi muito com eles.
Após o lançamento de O Mundo
Ainda é segredo, mas já estamos planejando a próxima viagem, que vai começar em 2008. Em breve, vamos revelar o destino e o percurso. Só posso dizer que será inédita.