Jubartes exploram parte da costa do Litoral Norte e colocam Ilhabela no mapa do Turismo de Observação de Baleias.

 

Nos últimos anos, a presença de baleias e golfinhos registrada ao redor de Ilhabela vem crescendo gradativamente. É cada vez mais comum ver nas redes sociais fotos e vídeos postados por quem sai para um passeio de barco e se surpreende com a aparição desses encantadores animais marinhos.

 

Os resultados do trabalho de projetos que se dedicam ao estudo e registro destas espécies em nossa região confirmam este crescimento e trazem dados e números impressionantes. Em 2019, a temporada de baleias-jubarte bateu todos os recordes da região e surpreendeu pesquisadores e ambientalistas que vêm acompanhando seus hábitos e rotas migratórias ao longo dos últimos anos.

 

É o caso do Projeto Baleia à Vista, capitaneado pelo ambientalista Julio Cardoso e pela bióloga Arlaine Francisco. Julio conta que no ano passado seu projeto registrou 26 avistagens de 42 jubartes. Neste ano, entre os meses de maio e julho, foram 66 avistagens de 101 indivíduos. Para entender melhor esta conta, a avistagem registra o momento em que uma baleia ou um grupo de baleias é visto no mar. Pode ser que o mesmo indivíduo ou grupo seja visto mais de uma vez, em ocasiões diferentes. Por isso, fazer 10 avistagens não significa registrar 10 baleias diferentes.

 

Na temporada de 2019, o Baleia à Vista ganhou um importante aliado. Por meio de uma parceria  com o Instituto Verde Azul, que promove o Projeto Viva Baleias, Golfinhos e Cia, passou a contar com as informações de um Ponto Fixo de Avistagem, instalado no sul da Ilha, na região do Borrifos, entre os dias 4 de junho e 23 de agosto.

 

A interação entre os dois projetos possibilitou um trabalho mais amplo e certeiro: os pesquisadores que estão em terra observam e registram a chegada das baleias, se comunicam com a equipe de Julio e eles se aproximam embarcados para coletar dados mais precisos.

 

O trabalho do Ponto Fixo, comandado pela bióloga Mia Morete, que tem mais de 20 anos de experiência com animais marinhos e atua há muitos anos em Abrolhos, revela números ainda mais expressivos: em menos de três meses foram 368 avistagens de baleias-jubarte!

 

Embora seja difícil precisar o número efetivo de baleias que passaram por aqui, como elas estão em rota migratória, apenas de passagem, Julio Cardoso acredita que, neste período, cerca de 300 jubartes visitaram as águas de Ilhabela.

 

Baleias, golfinhos e Cia – Esta foi a primeira experiência do Projeto Viva Baleias, Golfinhos e Cia em Ilhabela e os recursos que a equipe conseguiu para o aluguel e manutenção dos pesquisadores do Ponto Fixo permitiu que eles permanecessem por quase 90 dias. O alto valor da locação, sobretudo na alta temporada, é o principal fator que impossibilita a permanência do projeto durante o ano todo, mas eles seguem empenhados em encontrar uma forma de passar mais tempo por aqui.

 

Afinal, Mia lembra que além das baleias, que nesta temporada despertaram a atenção, diversas outras espécies de cetáceos frequentam a região, desde baleias de Bryde, Minke e Franca, Orcas e diversas espécies de golfinhos, até as raríssimas Toninhas, golfinho mais ameaçado de todo Atlântico Sul, que se encontra criticamente em perigo, segundo a Lista Oficial de Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção.

 

As baleias e o turismo

 

A chegada das baleias-jubarte a Ilhabela trouxe para o arquipélago uma nova e promissora possibilidade de atrativo turístico. Explorado em várias regiões do mundo, o Turismo de Observação de Baleias ou Whalewatching movimenta mais de US$ 2 bilhões por ano e ganha cada vez mais adeptos.

 

Em tempos marcados pela degradação ambiental, que já colocou em risco ou levou à extinção diversas espécies, oferecer aos visitantes a possibilidade de ver animais raros e extraordinários em seu ambiente natural é um ativo precioso!

 

E esta é uma atividade que tem tudo a ver com Ilhabela e com seu enorme potencial de paraíso ecológico, pois está relacionada à preservação do meio ambiente, promove a educação ambiental e garante a conservação das espécies, além atrair turismo qualificado, consciente e sustentável.

 

Ciente desta importante oportunidade e entusiasmada com a possibilidade de trazer para o arquipélago este novo produto turístico, Bianca Colepicolo, Secretária de Desenvolvimento Econômico e do Turismo de Ilhabela, afirma que a Prefeitura já está trabalhando em projetos e ações para estruturar o Turismo de Observação de Baleias no município. De acordo com ela, o novo produto deve ser lançado para a próxima temporada, em 2020. A Secretaria de Turismo também está preparando uma programação especial para junho do ano que vem, com um mês inteiro de atividades relacionadas ao tema.

 

Bianca tem trabalhado em diversas frentes para promover o desenvolvimento do turismo em Ilhabela e desempenhado papel de destaque na gestão. A criação desta nova atividade por aqui pode gerar um importante incremento à economia local, estimulando o turismo nos períodos de baixa temporada e minimizando os impactos da sazonalidade. No Brasil, a modalidade vem crescendo expressivamente nas últimas duas décadas, beneficiando comunidades costeiras ao longo de todo o caminho percorrido por estes animais. O público? Turistas brasileiros e estrangeiros, dispostos a desembolsar boas quantias em troca da experiência de interagir com espécies singulares, que estão ou já foram ameaçadas de extinção.

 

Entre os projetos em andamento está a assinatura de um convênio com o Instituto Baleia Jubarte, em parceria com os projetos Baleia à Vista e Viva Baleias, Golfinhos e Cia, para a capacitação dos condutores e guias turísticos que deverão ser credenciados para a atividade, além da preparação de ações de educação ambiental e informação turística, tanto para os pontos fixos de avistamento, que deverão ser estabelecidos, quanto para o turismo embarcado.

 

Há ainda uma proposta de utilização de um imóvel no sul da Ilha, que está há anos embargado e sem utilização, para a instalação de um Ponto Fixo de Avistagem, dando apoio às equipes de pesquisadores para que possam continuar o trabalho de registro e monitoramento das espécies, e de um núcleo de educação ambiental, onde os turistas poderão conhecer e aprender mais sobre as espécies.

 

Bianca explica que como se trata de uma propriedade embargada, é necessária a assinatura de um TAC – Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público para que o imóvel possa ser utilizado para este fim. De acordo com ela, a Prefeita Gracinha concordou com a proposta e o próximo passo é realizar uma consulta à Promotoria Pública para verificar a possibilidade de dar sequência ao projeto.

 

 

Gigantes do mar

 

As baleias-jubarte podem medir até 16 metros e pesar até 40 toneladas. Sua expectativa de vida é de 60 anos e a gestação de um filhote dura em média 11 meses. Passam o verão se alimentando nas águas geladas da Antártida, onde encontram sua comida favorita: o krill, um pequeno crustáceo semelhante ao camarão. No inverno, se deslocam para o litoral brasileiro, onde descansam, se reproduzem e cuidam da família, nas águas mornas do santuário de Abrolhos. A viagem dura dois meses e percorre quatro mil quilômetros.

 

Mas por que as baleias estão vindo para Ilhabela?

 

De acordo com Julio Cardoso, antes de 2015 era raro observar jubartes na região. Ele conta que a partir de 2016 elas começaram a aparecer em quantidade surpreendente e que há várias possibilidades para explicar esse fenômeno. Uma delas é o aumento da população, que cresce cerce de 10% ao ano. Outra está relacionada às mudanças climáticas e ao aumento da pesca, que ocasionaram a diminuição da oferta de krill na Antártida, registrada entre 2015 e 2016.

 

As avistagens constataram que a maior parte das baleias que passaram por aqui são animais jovens. Com o aumento da população e a diminuição da oferta de alimento, é possível que estejam voltando a ocupar antigas áreas de reprodução, em locais onde não se sentem mais ameaçadas. É importante lembrar que estamos falando de animais extremamente inteligentes, que se comunicam muito bem e desenvolvem atividades coletivas.

 

Também foi observada uma mudança de comportamento. Historicamente, a rota migratória das baleias passava longe da costa. As primeiras avisatagens registradas por Julio aconteceram em regiões mais remotas, como a Ponta do Boi e a Ilha de Búzios. Neste ano, se aproximaram muito da costa e pelo menos quatro grupos atravessaram o canal.

 

Segundo Marina Marques, uma das pesquisadoras que atuou no Ponto Fixo de Avistagem em Ilhabela, estima-se que antes da caça havia 30 mil baleias-jubarte dessa população que vem para o Brasil. Em 1980, estavam quase dizimadas e calcula-se que restou algo entre 800 e 3 mil indivíduos.

 

Em 1986 a caça foi proibida e projetos de preservação começaram a atuar. Nos últimos 30 anos a população vem se recompondo e as estimativas mais recentes, de 2015,  indicam uma população de cerca de 17 mil indivíduos da espécie para a costa brasileira. De acordo com Mia Morete, atualmente este número deve estar próximo de 20 mil. Em 2015, as jubartes saíram da lista de animais ameaçados em extinção.

 

É consenso entre os profissionais dos dois projetos que qualquer conclusão é precoce e que os estudos em andamento e sua continuidade são fundamentais para buscar essas respostas e garantir a proteção e conservação da espécie.

 

A volta das baleias

 

Há indícios históricos da presença de baleias em Ilhabela no passado, como o nome dado à praia da Armação (as armações baleeiras eram instalações litorâneas estruturadas para a pesca ou caça de baleias e processamento de seus produtos) e a região batizada de Borrifos, não por acaso escolhida para a instalação do Ponto Fixo de Avistagem, pois oferece ampla visão e possibilidade de identificar de longe o primeiro sinal de que há baleias na água: seu borrifo. Há também construções antigas que guardam paredes erguidas com o uso de óleo de baleia, como a centenária Igreja Matriz de Nossa Senhora D’Ajuda, na Vila.

 

No entanto, ao voltar para os territórios que ocuparam séculos atrás, elas encontram um cenário muito diferente: estão livres dos riscos da caça, que foi proibida em quase todo o mundo, mas encontram os  desafios impostos pela atividade humana.

 

Para os ambientalistas envolvidos com a causa, a presença desses animais traz dois sentimentos distintos: entusiasmo e preocupação. O segundo, sobretudo, pelo risco de acidentes com embarcações e redes de pesca. Esportes náuticos, barcos de recreio, atividade pesqueira e o intenso fluxo de turistas podem representar sérios riscos a estes novos visitantes. E também às pessoas. Jubartes são baleias acrobáticas e o seus movimentos podem causar acidentes graves e até fatais.

Por isso, Ilhabela vai precisar se preparar para mostrar ao mundo seus novos visitantes e para conviver com eles em harmonia. Estabelecer e implementar regras, promover a fiscalização, criar programas de educação ambiental e implantar o turismo de observação de forma ordenada e responsável são fatores fundamentais para que, no próximo ano, o arquipélago entre com o pé direito do mapa do Whale Watching.